Felicidade que durou pouco e já se transformou em rotina. Há duas semanas, sou repórter de esportes do jornal O Tempo. Deixo o programa diário Jogada de Classe, da TV Horizonte, onde fazia de tudo, já que a equipe era formada por uma única pessoa.
A experiência foi sensacional. Cheguei de um jeito e saí com conhecimento e experiência na bagagem. A pequena estrutura dificultava, mas compensava quando tudo dava certo. Trabalhar com TV é outro ritmo, principalmente quando se faz ao-vivo.
No jornal, é diferente. A facilidade para escrever contribui muito no trabalho.
O cavalo passsou montado e já era hora.
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Paixão de torcedor não passa assim
Torcedor fanático desde criança, percebeu na pré-adolescência que seria feliz fazendo o que gostava. Qualquer coisa no meio do futebol já seria válida. Pensou em Educação Física, Direito, Nutrição. Quando lembrou de Jornalismo e da facilidade que tinha para escrever e se comunicar, tomou a decisão que parecia mais acertada.
Na faculdade, teve dificuldade para conseguir um estágio. Ser colaborar de blogs esportivos foi o máximo que conseguiu. Continuava, fervorosamente, acompanhando o time do coração. Parava tudo que fazia para estar na frente da TV, vendo os jogos, discutindo escalação, esquema tático e contratações com os eternos companheiros de torcida.
Aos poucos, percebeu que mesmo nos seus comentários bloguísticos, não poderia externar toda a ‘doença’ que sentia. Seria demais e aquilo não cairia bem para quem queria ser visto como profissional. Conseguiu amenizar a paixão nos comentários e críticas, mas não suportava ver derrota atrás de derrota, sem se deixar abater.
Nos textos, emitia opiniões resumidas, sucintas, fazendo colocações pontuais e precisas. Mas no sentimento, o que acontecia era diferente. A má fase do time, que persistia em continuar há quase 11 meses, não passava e aquilo influenciava diretamente no seu dia-a-dia. O sono não era o mesmo, o humor também era afetado. Muitas vezes tinha que ser convencido por amigos, namorada e familiares que todo aquele desgosto não valia a pena.
Jogadores que ganhavam milhões não produziam o mínimo para o salário que ganhavam, bem distante do seu desempenho. Sabia muito bem de tudo isso, mas a paixão era demais. Não conseguia entender como muito pouco era mostrado por cada um daqueles contratados. Muitos ali haviam sido selecionados a dedo pelo presidente no momento da contratação. Disputas ferrenhas com outros clubes aconteceram para que aquelas peças estivessem à disposição do treinador com maior número de títulos no país.
Mas nada daquilo adiantava. Um CT de dar inveja a muitos clubes, um treinador de ponta, investimentos altos, jogadores renomados. As vitórias não apareciam. E insistiriam a não aparecer enquanto alguma providência drástica não fosse tomada.
Nesse meio tempo, conseguiu um bom emprego. Uma emissora de TV precisava de alguém apaixonado e envolvido com o futebol. A função era de produtor assistente: conseguir matérias, entrevistas, imagens e tudo que ia para o ar. Um emprego desejado por muitos, principalmente por ele, desde que tomou a decisão de trabalhar no meio do jornalismo esportivo.
Mas o time mantinha o mau desempenho. O emprego seria uma ótima oportunidade para deixar o baixo astral de lado. Focar no trabalho e esquecer a vergonhosa campanha era o conselho de todos que percebia, facilmente, que ele ainda não estava bem. Mas o time agora estava presente no seu cotidiano profissional. O que era pra ser uma válvula de escape, aflorou ainda mais o sentimento de revolta.
De nada adiantavam as longas conversas com a companheira de sete anos e os bate-papos com os amigos. Muitos destes já haviam se desapegado do time. Faziam questão de ver os jogos juntos, mais pela oportunidade de estar entre amigos do que pelo time, que não merecia nada, nem um ingresso na parte mais barata do estádio.
Afetado pela eterna má fase, manteve o emprego enquanto pôde. Chegou em uma situação de não cumprir mais os prazos estipulados e ver seu rendimento cair drasticamente. O chefe suportou enquanto pôde. A demissão foi questão de tempo.
Desempregado e cada vez mais sem esperança, conseguiu se desapegar de tudo quando uma nova oportunidade surgiu nas férias na Bahia: trabalhar em uma pousada no litoral. O dinheiro era bom e o lugar paradisíaco. Mas ali, não havia internet, time de futebol ou cidade grande. Era tudo muito simples e prático. Levou a namorada para lá, o salário daria muito bem para os dois.
Desapegou de tudo e pôde, finalmente, ser feliz. Pelo menos aparentemente. Conseguia estar tranquilo e fazer bem o seu trabalho. Mas os pensamentos no time sempre apareciam, queria saber como andava tudo por lá, se a má fase fora embora. Mas não chegava a comentar esta vontade.
O ambiente diferente era tudo que precisava para desapegar, pelo menos em parte, do time que foi tão importante na infância. Lá no fundo, o time nunca havia sido esquecido. Paixão de torcedor não passa assim.
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Na faculdade, teve dificuldade para conseguir um estágio. Ser colaborar de blogs esportivos foi o máximo que conseguiu. Continuava, fervorosamente, acompanhando o time do coração. Parava tudo que fazia para estar na frente da TV, vendo os jogos, discutindo escalação, esquema tático e contratações com os eternos companheiros de torcida.
Aos poucos, percebeu que mesmo nos seus comentários bloguísticos, não poderia externar toda a ‘doença’ que sentia. Seria demais e aquilo não cairia bem para quem queria ser visto como profissional. Conseguiu amenizar a paixão nos comentários e críticas, mas não suportava ver derrota atrás de derrota, sem se deixar abater.
Nos textos, emitia opiniões resumidas, sucintas, fazendo colocações pontuais e precisas. Mas no sentimento, o que acontecia era diferente. A má fase do time, que persistia em continuar há quase 11 meses, não passava e aquilo influenciava diretamente no seu dia-a-dia. O sono não era o mesmo, o humor também era afetado. Muitas vezes tinha que ser convencido por amigos, namorada e familiares que todo aquele desgosto não valia a pena.
Jogadores que ganhavam milhões não produziam o mínimo para o salário que ganhavam, bem distante do seu desempenho. Sabia muito bem de tudo isso, mas a paixão era demais. Não conseguia entender como muito pouco era mostrado por cada um daqueles contratados. Muitos ali haviam sido selecionados a dedo pelo presidente no momento da contratação. Disputas ferrenhas com outros clubes aconteceram para que aquelas peças estivessem à disposição do treinador com maior número de títulos no país.
Mas nada daquilo adiantava. Um CT de dar inveja a muitos clubes, um treinador de ponta, investimentos altos, jogadores renomados. As vitórias não apareciam. E insistiriam a não aparecer enquanto alguma providência drástica não fosse tomada.
Nesse meio tempo, conseguiu um bom emprego. Uma emissora de TV precisava de alguém apaixonado e envolvido com o futebol. A função era de produtor assistente: conseguir matérias, entrevistas, imagens e tudo que ia para o ar. Um emprego desejado por muitos, principalmente por ele, desde que tomou a decisão de trabalhar no meio do jornalismo esportivo.
Mas o time mantinha o mau desempenho. O emprego seria uma ótima oportunidade para deixar o baixo astral de lado. Focar no trabalho e esquecer a vergonhosa campanha era o conselho de todos que percebia, facilmente, que ele ainda não estava bem. Mas o time agora estava presente no seu cotidiano profissional. O que era pra ser uma válvula de escape, aflorou ainda mais o sentimento de revolta.
De nada adiantavam as longas conversas com a companheira de sete anos e os bate-papos com os amigos. Muitos destes já haviam se desapegado do time. Faziam questão de ver os jogos juntos, mais pela oportunidade de estar entre amigos do que pelo time, que não merecia nada, nem um ingresso na parte mais barata do estádio.
Afetado pela eterna má fase, manteve o emprego enquanto pôde. Chegou em uma situação de não cumprir mais os prazos estipulados e ver seu rendimento cair drasticamente. O chefe suportou enquanto pôde. A demissão foi questão de tempo.
Desempregado e cada vez mais sem esperança, conseguiu se desapegar de tudo quando uma nova oportunidade surgiu nas férias na Bahia: trabalhar em uma pousada no litoral. O dinheiro era bom e o lugar paradisíaco. Mas ali, não havia internet, time de futebol ou cidade grande. Era tudo muito simples e prático. Levou a namorada para lá, o salário daria muito bem para os dois.
Desapegou de tudo e pôde, finalmente, ser feliz. Pelo menos aparentemente. Conseguia estar tranquilo e fazer bem o seu trabalho. Mas os pensamentos no time sempre apareciam, queria saber como andava tudo por lá, se a má fase fora embora. Mas não chegava a comentar esta vontade.
O ambiente diferente era tudo que precisava para desapegar, pelo menos em parte, do time que foi tão importante na infância. Lá no fundo, o time nunca havia sido esquecido. Paixão de torcedor não passa assim.
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Repórter solitária, queria mesmo era ter amigos de verdade
Quem via de longe, achava que eram duas mil maravilhas. Trabalhar em TV de grande porte, viagens constantes, um bom salário, estar em alta no mercado.
O lugar que chegou era alto, sempre foi o foco. Começou na TV do bairro, passou pela da faculdade e foi crescendo. Cansou de engolir sapos (que aconteciam até hoje) e tomar porta na cara. Ficou desempregada algumas vezes, pensou em mudar de ramo, mas persistiu, batalhou, prosperou.
Quando via tudo isso, ficava feliz demais. Mas esse demais era pouco. Era quase tudo que tinha. A convivência e o calor humano eram o que faltavam. Depois de um noivado fracassado de dois anos, tudo terminou na hora certa, seria pior continuar. Amigos, dois, somente. Um morava em São Paulo. Jornalista competente, há alguns anos por lá. Quem sobrou era uma antiga colega de faculdade, também já não a via há meses.
Com os colegas de TV, tudo muito profissional. De casa para o trabalho e vice-versa, sem muito happy hour. Poucos sabiam da rotina esmagante pra manter o corpo e o visual em forma. Aparecer na TV não é fácil. Acordava às 6h pra natação, academia e pilates, em dias diferentes. O trabalho começava ao meio dia e ia até a hora que acabasse. A rotina era dura, mas prazerosa. O trabalho era tudo que tinha.
No Facebook, era um sucesso. Cheia de 'amigos', curtições e pedidos de amizade. No fundo, aquilo ali valia pouco. Quando muitos comentavam que sua profissão era a melhor do mundo, só pensava uma coisa: "Grandes bostas". Queria mesmo era ser feliz e ter amigos de verdade. ...read more ⇒
O lugar que chegou era alto, sempre foi o foco. Começou na TV do bairro, passou pela da faculdade e foi crescendo. Cansou de engolir sapos (que aconteciam até hoje) e tomar porta na cara. Ficou desempregada algumas vezes, pensou em mudar de ramo, mas persistiu, batalhou, prosperou.
Quando via tudo isso, ficava feliz demais. Mas esse demais era pouco. Era quase tudo que tinha. A convivência e o calor humano eram o que faltavam. Depois de um noivado fracassado de dois anos, tudo terminou na hora certa, seria pior continuar. Amigos, dois, somente. Um morava em São Paulo. Jornalista competente, há alguns anos por lá. Quem sobrou era uma antiga colega de faculdade, também já não a via há meses.
Com os colegas de TV, tudo muito profissional. De casa para o trabalho e vice-versa, sem muito happy hour. Poucos sabiam da rotina esmagante pra manter o corpo e o visual em forma. Aparecer na TV não é fácil. Acordava às 6h pra natação, academia e pilates, em dias diferentes. O trabalho começava ao meio dia e ia até a hora que acabasse. A rotina era dura, mas prazerosa. O trabalho era tudo que tinha.
No Facebook, era um sucesso. Cheia de 'amigos', curtições e pedidos de amizade. No fundo, aquilo ali valia pouco. Quando muitos comentavam que sua profissão era a melhor do mundo, só pensava uma coisa: "Grandes bostas". Queria mesmo era ser feliz e ter amigos de verdade. ...read more ⇒
Seu Saliva
Seu Saliva era um senhor de 68 anos, turco, que chegou ao Brasil depois da 2ª guerra, acompanhado da família, fugindo da babilônia. Tinha uma pequena venda embaixo de casa, nada lucrativo, apenas mantenedor. Figura carismática do bairro, era o morador mais antigo dali, há exatos 27 primaveras.
Apesar de querido, Seu Saliva tinha um defeito terrível: falava cuspindo. Não conseguia proferir palavras em seco, jamais. Pelo menos 1 ml 'de lambuja' era proferido pelo nosso personagem.
Aquilo incomodava a todos. Ninguém suportava conversar com Seu Saliva. Quando acontecia, distância era a regra número um. Um aceno de longe, do outro lado da rua, era recomendável. Apesar da boa praça de Seu Saliva, existia limite pra tudo.
No bairro, já era assunto conhecido e falado desde sua chegada. No começo, diziam, era bem pior. Depois de velho, não conversava mais como antigamente, jovem e casado.
O defeito (e apelido) de Seu Saliva só não era (re) conhecido por ele mesmo. A turma do bairro falava com todos, menos com o detentor da proeza difícil de se ver. O aproveitamento do turco era de quase 100%. Nem mesmo a esposa comentava, quanto mais os outros. A dedicação da vizinhança em manter o segredo era impressionante.
Em um aniversário, uma estrangeira distinta, amiga de seu neto, conheceu Seu Saliva de perto. De tão perto, que ficou metade do rosto molhado. Gritou palavras altas e indecifráveis, porém de baixo calão, com certeza. Olhou para o velho como se tivesse cometido um crime até a festa inteira parar.
Ainda aprendendo o português, errou quando disse 'esse seu saliva tá difícil', em alto e bom som, facilmente compreendido por quem estava perto. Limpou o rosto enquanto uns riram, outros não. Sem graça, viu-se em volta do primeiro constrangimento internacional.
Seu Saliva conseguiu ficar mais sem graça do que a ingrata visita. No espelho do banheiro, impressionou-se. Quando voltou, sugeriu um novo apelido para si mesmo: Seu Saliva, em homenagem ao equívoco verbal e a seu distúrbio, que virou motivo de piada pública, depois de longo tabu.
* em homenagem à amiga Malin Sjöstrand ...read more ⇒
Apesar de querido, Seu Saliva tinha um defeito terrível: falava cuspindo. Não conseguia proferir palavras em seco, jamais. Pelo menos 1 ml 'de lambuja' era proferido pelo nosso personagem.
Aquilo incomodava a todos. Ninguém suportava conversar com Seu Saliva. Quando acontecia, distância era a regra número um. Um aceno de longe, do outro lado da rua, era recomendável. Apesar da boa praça de Seu Saliva, existia limite pra tudo.
No bairro, já era assunto conhecido e falado desde sua chegada. No começo, diziam, era bem pior. Depois de velho, não conversava mais como antigamente, jovem e casado.
O defeito (e apelido) de Seu Saliva só não era (re) conhecido por ele mesmo. A turma do bairro falava com todos, menos com o detentor da proeza difícil de se ver. O aproveitamento do turco era de quase 100%. Nem mesmo a esposa comentava, quanto mais os outros. A dedicação da vizinhança em manter o segredo era impressionante.
Em um aniversário, uma estrangeira distinta, amiga de seu neto, conheceu Seu Saliva de perto. De tão perto, que ficou metade do rosto molhado. Gritou palavras altas e indecifráveis, porém de baixo calão, com certeza. Olhou para o velho como se tivesse cometido um crime até a festa inteira parar.
Ainda aprendendo o português, errou quando disse 'esse seu saliva tá difícil', em alto e bom som, facilmente compreendido por quem estava perto. Limpou o rosto enquanto uns riram, outros não. Sem graça, viu-se em volta do primeiro constrangimento internacional.
Seu Saliva conseguiu ficar mais sem graça do que a ingrata visita. No espelho do banheiro, impressionou-se. Quando voltou, sugeriu um novo apelido para si mesmo: Seu Saliva, em homenagem ao equívoco verbal e a seu distúrbio, que virou motivo de piada pública, depois de longo tabu.
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