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sexta-feira, 24 de julho de 2015

Concorrência

Sou a favor do Uber. Por que ser contra um atendimento melhor e mais atencioso, contra um serviço mais prestativo e satisfatório? O conforto é outro, disso não há dúvidas. Os motoristas parece que fazem questão de atender bem, ao contrário de tantos taxistas, que fumam dentro do carro e não conseguem manter um simples diálogo. Há casos e casos.
A concorrência aparece para todos, em vários setores, e com os taxistas, que antes pareciam únicos na praça, não está sendo diferente. Talvez seja bom para que ela revejam alguns conceitos.
No México, o Uber foi regulamentado e acredito que esse pode ser o caminho. Colocar pré-requisitos, taxas ou algo parecido para que eles possam rodar. Não sei se isso acontecerá, mas seria um cenário ideal.
E os interessados que optem pelo serviço que irão usar e pelo 'investimento' que irão fazer. As 'jogadas de marketing' do Uber estão de parabéns. A última dela foi dar picolés de graça para os clientes. Estas e outras ações estão deixando os taxistas furiosos. Bom para aprender. A realidade é essa e aparece para todos. Sairão bem dela quem souber lidar de uma forma mais eficaz e criativa.

E nisso, os taxistas estão atrás. O que conseguiram, até agora, foram protestos e agressões. Posturas longe do reconhecimento que poderiam ganhar com uma alternativa covarde e longe de chegar a uma solução.
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terça-feira, 21 de julho de 2015

Custa nada


Não sabia, mas podia ser considerado um profissional diferenciado. Afinal, quantos garçons como ele tinham a noção para tirar uma boa foto, com composição, textura, enquadramento e um ângulo decente? Poucos, com certeza.

Com 19 anos, fez um curso de fotografia e entrou naquele mundo, mesmo que aos poucos. Comprou uma câmera mais antiga com o primeiro salário e ia investindo quando e como dava. Uma lente aqui, outra ali...

O sonho de viver da fotografia ficou pelo caminho e teve que se virar. O trabalho no restaurante perto de casa, aos 35, servia para compôr a renda do escritório, onde ficava durante o dia. Pouca gente sabia como um garçom ganhava bem, considerando a realidade do período. Em alguns meses, o salário no restaurante superava o 'emprego fixo', graças às generosas gorjetas.

Boa parte delas vinha da sua simpatia e das fotos que tirava, acreditem ou não. Alguns clientes não demoraram a perceber seu talento para a coisa e sempre pediam uma nova foto, mesmo com as mesmas pessoas reunidas. Era postar a foto que curtidas e comentários nas redes sociais se espalhavam, alguns elogiando o talento do fotógrafo. Uma das clientes fez questão de colocar uma das fotos tiradas por ele na sala de casa, de tão boa que ficara. A data da reunião, claro, contribuíra.

Enquanto alguns colegas não tinham a menor condição de registrar uma imagem, ele já se mostrava diferenciado no assunto. Ficava na dele, sem dar dicas para os possíveis 'concorrentes'. Sabia que suas fotos faziam sucesso entre os frequentadores do restaurante. Alguns quadros que decoravam o salão, inclusive, eram de fotos feitas por ele, em parceria com o proprietário, que prometeu guardar segredo. Pratos e paisagens, em sua maioria.

Por mais que a renda o deixasse contente no final do mês, uma grande alegria veio em uma manhã qualquer. Uma cliente antiga e assídua, que ele não imaginava ser uma megaempresária, fez questão de lhe dar o crédito em foto enviada para uma coluna social. Seu nome acabou aparecendo em um dos maiores jornais do país. Foi avisado pelo 'incidente' pelo dono da banca de revistas na esquina de casa.

A partir daí, sempre que tirava uma foto de clientes, mesmo para postagem em redes sociais, fazia um pedido que nunca era esquecido. 'Tem como dar crédito?'

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quinta-feira, 12 de março de 2015

Caiu na rede



Estava ali há mais de 20 minutos e nada do amigo chegar. Tinha acabado de pedir o terceiro chopp quando viu na mesa ao lado um casal se pegando, daquele jeito. Tentou desviar a atenção, mas a coisa estava além do normal.

Não pôde deixar de reparar no rabo de cavalo pintado de roxo da bonita moça. Lembrou-se, quase que de imediato, de um vídeo que havia recebido, dias antes, no grupo de amigos.

Pegou o telefone e não conseguia acreditar no que via. O casal ao lado era o mesmo do vídeo que recebera. Dois minutos e vinte segundos que o fizeram ver o vídeo repetidas vezes. O casal do vídeo era o casal ao seu lado, não tinha dúvidas.

Como era possível? Preferia nem pensar, só tinha certeza que eram eles.
Não demorou para receber uma mensagem do amigo informando que não chegaria a tempo. Pediu mais um chopp e não conseguia tirar o olho do afortunado casal.

Imaginou se eles já sabiam da propagado vírus. Instantes depois, a moça ficou sozinha na mesa quando o companheiro foi ao banheiro. Olhou para ela e foi retribuído de imediato. Sorriu, ela sorriu. Piscou, ela piscou. Tudo aquilo estava acontecendo, de verdade.

Quando o rapaz voltou, não resistiu. Foi até a mesa deles e, com muito jeito, se apresentou e falou do vídeo. Perguntou se eles sabiam, foi informado que sim e ficou impressionado com a naturalidade do casal. Sentaram juntos, estavam namorando há apenas três meses.

 - Vocês não se incomodam?

 - Nem um pouco. Deixamos os outros pensarem o que quiserem. Meu celular foi roubado e o vídeo caiu na rede. Paciência... - respondeu a moça.

O que era para ser um happy hour virou uma noitada a três. O bar foi seguido de boate e ainda se beliscava quando entrou numa suíte com os dois. A noite foi daquelas e pouco era lembrado na manhã seguinte. Ressaca, boca seca, dor de cabeça e amnésia. Beber vodca dá nisso...

A presença no serviço pela manhã foi estranha, cheia de olhares. Era ele o mais novo membro de vídeos que se propagam na rede. Na atividade e passividade, ficou famoso de um jeito que não queria. Não conseguia ter a tranquilidade do casal em não se importar com tudo. Demorou para se dar conta de que fora vítima de um golpe sujo, praticado por salafrários sedentos por uma perdição que tão pouco seria esquecida.

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quarta-feira, 4 de março de 2015

Tapa de luvas

Tapa de luvas

O encontro já tinha mais de dez anos, mas vivia mal das pernas. Aquela 'pelada' semanal, que chegou a contar com três times e meio de fora, agora custava a ter dois times completos para o bate-bola.

Entradas e saídas foram constantes e quem ficava responsável pelas confirmações, ausências e substituições sofria a cada semana. Tinha que ligar do próprio telefone para achar alguém que cobrisse buraco, tirar um goleiro do gol e colocar na linha e por aí vai. Perdeu a conta de quantas semanas foram perdidas, aluguéis indo pro espaço.

Em um deles, um amigo de um amigo se prontificou e chegou pontualmente, quando todos já estavam prontos. Quando o viram, com seus 1,60m, se surpreenderam com o que foi dito.

- Jogo no gol.

- Como assim joga no gol? Vc não trouxe luva, meião, short de goleiro, camisa, nada. E sua altura também não ajuda...

- Só jogo no gol. E descalço.

- Oi?

- De que lado fico?

E, sem resposta, foi pra um dos times. Os risos de alguns antes da bola rolar foram engolidos a seco assim que chutes, cruzamentos e lances de perigo apareciam.

Com bom posicionamento e antecipação, ele fechou o gol, literalmente. Seu time venceu por 8 a 1, um gol contra foi marcado e nada além disso.

Na saída, quando calçava o chinelo, recebeu os cumprimentos de uns e o convite do organizador. Na semana seguinte, voltou e ganhou de presente uma luva de um dos novos colegas.

 - Não precisava, mas vou aceitar.

Muitos não percebiam, mas quando a bola estava distante, as unhas do pequeno goleiro sofriam. Pelo menos foi assim na sua estreia.

Com as luvas, os dedos foram preservados e foi somente por isso que o presente foi aceito. Nada de pimenta ou coisa parecida para evitar o péssimo hábito, que acontecia somente dentro de quadra, sabe-se lá o porquê.

A luva, agora, era parceira frequente e não foi mais abandonada. Descalço, com short sem proteção, mas de luva, ele continuou fechando tudo e fazendo questão de jogar sempre no time do responsável pelo presente.

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sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Saindo dos trilhos



Todo dia era a mesma história. Entrava na estação do metrô e espiava bem para ver se nenhum fiscal ferroviário estava por perto. Não gostava de chegar ali no horário de pico, seu trabalho não seria feito da mesma forma. O horário das 11h era o ideal, menos gente e mais silêncio para tentar sensibilizar um único passageiro que fosse. Com pouco esforço, a meta era superada diariamente.

Com 37 anos de idade, separado e pais de dois meninos, ele tinha uma oratória única e chamativa. Pedia um trocado diariamente e tudo que arrecadava ia para o sustento próprio. Muitos duvidavam, mas outros tantos eram convencidos com sua história de vida, contada resumidamente em pouco mais de cinco minutos.

Este tempo era suficiente para percorrer duas estações e pular para um outro vagão. Chegava na estação final e ia para o outro lado, onde o trem voltava ao seu trajeto inicial. Cansado de procurar emprego e dos preconceitos, decidiu que focaria no seu poder de persuasão enquanto ele estivesse funcionando.

Ao contrário de muitos outros, ele não precisava entregar papéis ou vender balas ou chicletes. Seu poder estava na palavra, no tom de voz, na sinceridade.

Mal sabia como dava certo, só tinha a certeza que funcionava. Falava com o coração, com a calma. Contava boa parte de sua trajetória de vida e antes mesmo de terminar, já tinha gente contando trocados para lhe dar. Quando viu uma moça jovem chorando depois de ouvir seus relatos, viu que tinha potencial para a coisa.

Contava das dificuldades de levar comida pra casa, do filho com fome, das ausências do mais novo na escola por não ter como ir, das desculpas que ele inventava para eles para sofrerem menos. Quando um pouco aparecia, não pensava duas vezes para dar a ele, abdicando de sua própria alimentação ou felicidade.

A mãe havia sumido, desapareceu e nunca mais deu notícia. Tinha que se virar, deixava os filhos com a avó, aposentada e moradora de uma favela. Todos residiam juntos em um barraco de dois cômodos.

Em um dia comum, quando faltava pouco tempo para terminar a última viagem, foi abordado por um senhor de terno, que lhe entregou um cartão com um endereço. Foi no local no dia seguinte, mesmo receoso.

Ficou na dúvida quando chegou em uma igreja evangélica. Foi recebido pelo mesmo homem, que afirmou ter ficado impressionado com sua história de vida. Viu ali um potencial enorme para pregar e o convidou para ser pastor, com uma renda fixa e comissão sobre tudo que entrasse na casa de Deus como contribuição dos fiéis.

Mudou de vida, mas continuou tendo sua oratória como o ganha-pão. Nunca mais abandonou a igreja e fazia questão de usar suas experiências nos trens da capital para motivar e convencer seu rebanho. Seu depoimento ganhou um outro contorno, mas com a mesma base que sempre trilhou seu caminho.

A vida melhorou e sua evolução era um exemplo constante. Ele na sua história que ele convencia quem o ouvia de que tudo na vida tem sua hora, para o bem ou para o mal.


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