| |

segunda-feira, 31 de março de 2008

João Congo


Nunca tinha ouvido falar em João Congo. Muito menos visto. E foi, do nada, que acabei conhecendo a mais bela espécie de pássaro que existe no planeta. Conhecendo "de ouvir", é claro. Para vê-los, não é fácil.

Ontem, acompanhei o pai de um amigo em uma visita à uma amiga artista plástica chamada Valdelice Neves. A dita cuja é simplesmente um encanto. Super educada, com uma voz doce, suave e uma gargalhada contagiante. Super alto astral, bom humor lá em cima, difícil de não se encantar. Assim que entramos, me surpreendi com sua casa, cheia de quadros e pinturas por todos os lados. Deviam ter mais de 200 quadros na casa, por todos os lados mesmo. Mas a paixão da artista plástica é o João Congo, pássaro que possui 49 espécies e tem um canto belíssimo. Um não, vários. O João Congo imita o canto de todas as aves existentes na floresta. E essa é apenas uma das características deste pássaro, que só vive em bandos e é extremamente sociável com seus "parentes". Tão sociável, que seus ninhos são construídos todos próximos uns aos outros, como ilustra a figura acima. O ninho tem o formato de uma bolsa, de cerca de 30cm de comprimento.

Além disso, o João Congo é extremamente fiel. Uma vez escolhida a companheira, aquela será a única que irá passar pela vida do macho. Mesmo após a morte da companheira, o João Congo permanece sozinho. Para sempre. Existe um relato de um macho que, após a morte da companheira, vai até o local onde eles foram separados. Diariamente.
Os ninhos de João Congo são extremamente interessantes. Parecem uma grande bolsa, com uma estrutura mais "sólida" na sua base, onde ficam os filhotes. O ninho é tecido com o pássaro de cabeça para baixo e as "costuradas" realizadas pelo pássaro para a construção do ninho são mais rápidas do que agulhas de uma máquina de costura. Que belo espetáculo deve ser ver um João Congo tecendo sua casa. O detalhe é que, próximo à todos os ninhos de João Congo, existe uma casa de marimbondos-flecheiros, espécie mais agressiva de marimbondos, que os protege. Quem ousa se aproximar é picado incessantemente, muitas vezes até a morte.

O fato da proximidade entre João Congo e marimbondos também chama a atenção. Baseada em pesquisas e relatos da população indígena da Amazônica, Valdelice Neves criou uma lenda (existem várias outras) que diz que, enciumado pelo canto e pela imensa vaidade e beleza do João Congo, o pássaro Tanguru Pará resolve se manifestar juntamente com as outras aves da floresta. Diz a elas que é um absurdo um pássaro se comportar daquela forma exagerada, um desrespeito enorme com os outros habitantes da floresta. As aves acabam sendo convencidas pelo Tanguru Pará e resolvem ir ao pai da Floresta, que agora tem o nome esquecido por mim. O Tanguru Pará, representante daquela associação, diz ao pai da floresta tudo o que pensam, e acabam por convencê-lo também. O pai da floresta resolve chamar João Congo e muito aborrecido, lhe informa sobre a visita que recebeu e resolve lhe punir de duas formas: o João Congo viveria para sempre ao lado de marimbondos-flecheiros e deixaria de cantar, para todo o sempre. Desesperado, o João Congo, imediatamente resolve correr atrás do prejuízo.

Como ave inteligente e sabida que era, ele resolve se aproximar dos marimbondos e explicar-lhes o ocorrido. E diz aos marimbondos: fui condenado e terei que viver próximo à vocês eternamente. Os marimbondos aceitam, mas com algo em troca, é claro. O João Congo lhes oferece a sua sabedoria. Sabendo que os marimbondos se aproveitam do que lhes passa ao seu redor para construir suas casas (os marimbondos não tem condições de construir seu ninhos através de sua própria capacidade e aproveitam as formas existentes ao seu redor), o João Congo lhes oferece a sua bela arquitetura, que seria então, aproveitada e copiada pelos marimbondos, que aceitam o pedido e chegam a um acordo.

Pois bem. A primeira parte do plano estava pronta. Agora faltava a parte do canto. João Congo resolve passear por toda a floresta e ouvir todos os pássaros que ali existiam, gravando todos esses cantos para sempre em sua memória. No entanto, seu canto original nunca foi recuperado. Além disso, existe uma única espécie de pássaro que o João Congo não imita o seu canto: o Tanguru Pará. Traidor! Isso é fato, de verdade mesmo. Qualquer espécie de João Congo não suporta ver um Tanguru Pará. Assim que um bando de João Congo avista um Tanguru Pará, eles batem em retirada, imediatamente.

Dizem que o canto mais triste da Floresta Amazônica é o do Tanguru Pará, por não ter seu canto imitado pela mais bela e inteligente ave da floresta e que quando ele canta, parece que a floresta chora, de tanta tristeza que existe em seu som. Ao contrário dos cantos do João Congo, que são considerados a alegria da floresta e extremamente contagiantes. Seu bom-humor é outra caractéristica bastante conhecida.

Todas essas informações são passadas, de geração em geração pela população indígena, que não deixa tais histórias se perderam no tempo, ao contrário da nossa cultura. Todas as histórias indígenas são passadas aos mais novos e recebem uma valorização bem maior que a nossa.
Além disso, o João Congo serve como referência para muitas populações ribeirinhas. Ao perceberem, que o João Congo faz seu ninho em uma parte mais baixa da árvore, a população sabe que naquele ano, será uma época de seca e deixam de plantar e realizar outras atividades em virtude da seca que virá. No entanto, quando o João Congo faz seu ninho nas copas das árvores, é sinal de que aquele ano será de cheia, deixando toda a população feliz com as chuvas que virão. Sábia mãe-natureza!

Fiquei impressionado com os relatos de Valdelice Neves. Conversamos (conversamos não, ouvi) por cerca de 40 minutos sobre o João Congo, suas histórias e as visitas que ela fez à Floresta Amazônica, juntamente com seus guias, á procura de ninhos e informações deste belo pássaro.
Valdelice Neves também realiza um belo projeto com ex-pichadores, que estavam inseridos no mundo das drogas e criminalidade e que hoje, são grafiteiros, artistas e educadores de outras crianças residentes em áreas de risco.

Do nada, recebi uma aula de tirar o fôlego. O que era para ser uma visita, acabou sendo umas das maiores experiências que já tive. Fiquei impressionado com tudo: com a casa, com a dona da casa, com suas obras, suas histórias, sua forma de ser, falar, ouvir...

Pretendo voltar lá, com um caderno de anotações e passar horas e mais horas ouvindo relatos e causos desta artista plástica tão famosa, mas que até então era desconhecida por mim.

5 comentários:

Gabi disse...

sensacional! estou arrepiada com a historia do joão congo.

se puder levar mais gente c vc, gostaria de conhecer a Valdelice Neves tb =)

bju!

Anônimo disse...

Fico feliz, por Vc ter conhecido a Valdelice Neves.É realmente uma pessoa maravilhosa, e uma artista espetacular.

Anônimo disse...

Thank yοu for commenting аnԁ offеring us а good update.

It haѕ remіndеd me that I need to еԁit the abοѵe page with the latеst details!


Reviеw my web page ... http://wikicookrecipe.com/

Anônimo disse...

Keep on wгiting, great job!

Feel free to visit my websіtе: Http://Www.Sfgate.Com/Business/Prweb/Article/V2-Cigs-Review-Authentic-Smoking-Experience-Or-4075176.Php

Anônimo disse...

Εхcellent goods frοm yοu, man.
I've understand your stuff previous to and you are just extremely wonderful. I really like what you've acquiгеd here, reаlly like what you're saying and the way in which you say it. You make it enjoyable and you still care for to keep it smart. I can't wait tο read fаr more from you.

This is reallу a wonderful sіte.

my web page; hair removal system