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quarta-feira, 27 de maio de 2009

Vitória

Era só ele e ela. Na beira do mar, via a imensidão do oceano bem à sua frente.

As ondas enormes, de oito ou nove metros, estouravam e faziam um barulho ensurdecedor. Mas queria escutar esse barulho bem de perto.

Ao mesmo tempo em que havia toda a calma daquele infinito azul, havia o risco e a adrenalina de ser engolido e cuspido em poucos segundos. Ninguém se esquece de um caldo daqueles.

Ele com ela em mãos, pronta para a aventura. Via tudo ao seu redor, ninguém. Só ele, ela e o mar.

Aproximou e sentiu a água gelada tocar-lhe os pés. Isso era o de menos.

Havia se preparado durante dois meses para aquilo, era chegada a hora. Abriu mão de muitas festas, mulheres, noitadas. Teria muito tempo para tudo aquilo.

Mas para sua nova aventura, o tempo era agora. Não ia ganhar dinheiro nem entrar em livro dos recordes. Fazia aquilo por ele mesmo, para provar que ainda era possível, mesmo depois do último fracasso. Um pequeno erro comprometeu a última tentativa, que o fez ficar no estaleiro por sete longos meses.

O físico, a técnica e o psicológico andavam juntos e tinham igual importância naquele momento. Entrou na água sem pensar muito. Agora não tinha mais no que pensar. Era entrar e fazer.

Mergulhou para sentir o frio e acostumar-se de vez. Tudo pronto, era só esperar.

Foram seis longos minutos até ver a onda perfeita. Vinha lá de trás, bem distante. Outras muito bem formadas apareciam antes e depois. Ali era, definitivamente, o paraíso do surfe. Mal podia acreditar que estava em um lugar daqueles sozinho. Sozinho não. Ele e ela.

Começou a remada lenta, como de praxe. Deixou a primeira passar e esperou o momento perfeito. Acelerou a braçada e entrou perfeito. No momento de ficar em pé, quase um deslize fatal. Equilibrou-se bem para começar a descer, lentamente. As primeiras gotas da espuma caíam sobre o cabelo liso, que ameaçava tampar sua visão. Na primeira manobra, já mandou água pra cima. O barulho da enorme onda começando a bater na água já podia ser ouvido, mesmo que estivesse longe e ao mesmo tempo tão perto. Diminuiu um pouco à espera do tubo. Foi num desses que seu último pesadelo havia sido vivenciado. Mas não dessa vez.

O tubo perfeito foi encaixado. Foram longos onze segundos por dentro de uma das melhores ondas de sua vida. Enquanto estava dentro dela, manteve-se ereto, com o corpo completamente esticado. Ali, tinha uma visão linear da praia, bem ao longe. Esticou o braço e enquanto o tubo acontecia, sua mão direita tocava a onda que em breve, iria estourar no manto azul. O barulho era realmente ensurdecedor.

Um tubo perfeito proporciona uma sensação rara, comparada a poucas na vida. Sair dali ileso era uma vitória e tanto. Antes do tubo, todas as manobras entraram muito bem. Pena que ninguém havia visto. Fora um verdadeiro espetáculo, digno de um mínimo nove em competições profissionais.

Há muito tempo não competia, agora fazia por ele e para ele.

Seu sucesso era notável e o medo de antes havia ficado pra trás.

Agora em terra, via as outras ondas que quebravam, bem parecidas com a que havia acabado de entrar. De longe, parecia impossível ou loucura encarar uma coisa daquele tamanho.

Mas quando se está ali, nada passa pela cabeça. É ir ou ficar. E foi, para nunca mais esquecer que podia fazer aquilo, como poucos.

Andou de volta à casa, escutando as ondas baterem na praia, como se o aplaudissem.

2 comentários:

Paula Carolina disse...

Mandou bem hein?! Acho tão bacana quando vc consegue transmitir uma coisa, como se tivesse vivenciado aquilo, enquanto na verdade, nunca surfou na vida!! rs

Adorei essa frase final:
"Andou de volta à casa, escutando as ondas baterem na praia, como se o aplaudissem."

=)

renanmportes disse...

mais uma! bacana demais! e aos poucos o livro vai ganhando páginas...